#CenastípicasAQA: O Rapto das Sabinas

Conheça a história por trás desta cena que foi retratada repetidas vezes na história da arte em vários momentos diferentes

O rapto das sabinas, Sebastiano Ricci, 1700.
O rapto das sabinas, 1700, Sebastiano Ricci.

O rapto das mulheres sabinas foi uma passagem histórica que ocorreu logo após a fundação de Roma, cuja história é essencial para a ampla acepção do episódio. O império romano foi um dos maiores de toda a história antiga e sua importância e legado para o mundo moderno são inegáveis, mas nem sempre nos lembramos de como tudo começou. 

O rapto das sabinas 1, 1633, Nicolas Poussin.
O rapto das sabinas 1, 1633, Nicolas Poussin.

A história deste reino e império se inicia em meados do século VIII a.c., com a lendária história da fundação de Roma. Segundo a lenda, narrada por poetas como Virgílio e historiadores antigos como Lívio, Enéias, príncipe troiano fugia de sua cidade após a destruição deixada pelos gregos quando chegou ao Lazio, região da península itálica. Lá ele se casou com Lavínia, filha de um rei latino, e com ela iniciou uma longa linha de reis da cidade de Alba Longa. Um destes reis, Numitor, teve seu trono usurpado pelo irmão mais novo, Amulius, que forçou a sobrinha Reia Sílvia a se tornar uma virgem vestal para não gerar herdeiros que pudessem vir a clamar o direito ao trono de seu avô. 

O rapto das sabinas, 1635, Peter Paul Rubens.

Entretanto, diz a lenda que Reia Sílvia fora estuprada por Marte, Deus da guerra, gerando dois filhos: Rômulo e Remo. Amulius, então rei, jogou os bebês recém-nascidos no rio Tibre com a intenção de entregá-los à morte. Os meninos, entretanto, sobreviveram graças a uma loba que os acolheu e amamentou. Rômulo e Remo crescem, então, junto aos pastores da região praticando caça e vivendo de saques a caravanas que por ali passavam até que, um dia, Remo é capturado em um assalto e levado a Alba Longa. Rômulo acaba descobrindo a verdade sobre o passado, o que o leva a libertar seu irmão, matar Amulius, recolocar Numitor no trono e devolver a sua mãe seu lugar de direito. Depois de toda esta empreitada, os irmãos decidiram seguir em frente e fundar a sua própria cidade próximo ao local onde foram abandonados. Após divergências sobre os planos para fundar a cidade, os irmãos entraram em um conflito que culminou com a morte de Remo pelas mãos de Rômulo, que fundou Roma tornando-se seu primeiro rei. 

O rapto das sabinas, 1963, Pablo Picasso.
O rapto das sabinas, 1963, Pablo Picasso.

Logo após a fundação da cidade, Rômulo e seus seguidores se depararam com um problema: seu grupo era majoritariamente composto por homens e não havia mulheres suficientes para popular a nova cidade. Rômulo, então, se dirigiu aos sabinos, povo itálico que habitava as proximidades, pedindo-lhes permissão para que seus homens desposassem suas mulheres. Este pedido foi prontamente negado, o que levou Rômulo a planejar o momento perfeito para executar seu plano independentemente da permissão dos sabinos. Ele organizou então um festival em homenagem a Netuno, deus dos mares equivalente a Poseidon na mitologia grega, e convidou todos os povos vizinhos para participarem da festa. Durante o evento, ao sinal de Rômulo, as mulheres sabinas foram raptadas pelos romanos que as convenceram a se casar com eles. 

O rapto das sabinas, 1582, Giambologna.
O rapto das sabinas, 1582, Giambologna.

Vale ressaltar que há muitas leituras e traduções diferentes desta história. Na língua inglesa o episódio é conhecido como “the rape of the sabine women” que traz a noção de “estupro” – melhor tradução para a palavra inglesa “rape”. Entretanto, o episódio é originalmente narrado no latim e traz o termo “raptae”, que é comumente adaptado às línguas latinas como “rapto”. Tudo isso para dizer que muitas vezes o episódio é citado como “o estupro das sabinas” e os historiadores da época sustentam a versão de que apesar de elas terem sido raptadas, não houve abuso sexual e elas não foram “forçadas” a se casar, mas sim “convencidas” pela ideia de se tornarem parte da primeira geração de Roma e mães de homens livres. 

O rapto das sabinas, 1573, Christoph Schwarz. 
O rapto das sabinas, 1573, Christoph Schwarz. 

Trouxemos essa explicação aqui pois este é um episódio que costuma gerar um tipo de “dúvida” em relação a traduções e versões e, apesar de estarmos a quase trinta séculos de distância destes eventos, é impossível compreender de fato aquilo que se passou e nos resta ater-nos às leituras e compreensões da época sempre lembrando que elas pertencem ao imaginário e aos princípios desta. Mas sim, algo que você pode estar pensando é inegável: com estupro ou sem estupro, estamos falando de mulheres que foram raptadas de suas famílias e, independente de interpretações, é uma história violenta, de guerra e machista. 


O rapto das sabinas, 1640, Johann Heinrich Schönfeld.
O rapto das sabinas, 1640, Johann Heinrich Schönfeld.

Narrada a lenda, vamos à arte. Esta cena típica foi retratada muitas vezes, em suportes e movimentos diferentes e por artistas separados por séculos. Durante o renascimento italiano, o escultor Giambologna (1529-1608) reproduziu a cena em mármore, produzindo uma de suas mais belas esculturas. Mais tarde, nos tempos modernos, Pablo Picasso (1881-1973) fez algumas versões da cena, retratando diferentes momentos do conflito e destacando a violência do ato. Já Jacques-Louis David (1748-1825), expoente francês do neoclassicismo e pintor oficial da corte francesa e de Napoleão Bonaparte, escolheu retratar uma outra cena ligada à mesma história e posterior ao rapto das sabinas, ele retrata, na tela A intervenção de uma mulher sabina, o momento em que os sabinos, enfurecidos com a ascensão de Roma, atacam a cidade. 

A intervenção de uma mulher sabina, 1799, Jacques-Louis David
A intervenção de uma mulher sabina, 1799, Jacques-Louis David.

As mulheres sabinas, então esposas dos romanos e mãe de seus filhos, intervêm em favor de seus maridos e filhos. Nesta tela de David, estão retratados Rômulo, do lado direito, que aponta sua lança na direção de Tácio, líder dos sabinos que está do lado esquerdo. Ao centro, uma mulher sabina se coloca entre os dois e tenta impedir a matança. Ela é Hersília, esposa de Rômulo e filha de Tácio. Esta tela, embora não retrate exatamente o rapto, é uma das reproduções mais famosas desta história e é, hoje, tida como uma das mais valiosas pinturas da França.

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