Cor em movimento: Abraham Palatnik

A cor ganha volume e a forma ganha movimento: foi esse processo intuitivo e radical que levou Abraham Palatnik a mudar a maneira que encarava a arte. O artista foi responsável por uma transformação profunda da compreensão do que a produção pictórica poderia ser pra além de telas, tintas e pincéis, em parte influenciado pelo contato com a arte dos pacientes psiquiátricos internos no Engenho de Dentro.

Nascido em Natal, filho de imigrantes ucranianos, Palatnik tem uma trajetória curiosa e absolutamente singular: primeiro, passou a infância e juventude em Tel Aviv, onde estudou engenharia mecânica; depois, começou a frequentar ateliês de artistas e a pintar; por fim, voltou ao Brasil e instalou-se no Rio de Janeiro, onde conheceu a Dra. Nise da Silveira e seu trabalho de arte como terapia. Essa experiência mediou o abandono da figuração, o que coincidiu com a aproximação ao crítico Mario Pedrosa e a artistas ligados à abstração e ao concretismo. “O impacto das visitas ao Engenho de Dentro e as conversações com Mário Pedrosa demoliram minhas convicções em relação à arte”, dizia ele.

O final dos anos 1940 foi o ponto de inflexão em sua produção pessoal, quando abandonou a figuração de maneira definitiva e logo passou a explorar possibilidades pictóricas com a luz e o movimento – foi aí que sua experiência com a mecânica se misturou com seu trabalho.

O artista começou a experimentar com pequenos motores que mobilizavam lâmpadas atrás de uma tela ou chapa leitosa, como um backlight. Os objetos emulavam transformações luminosas do amanhecer ou anoitecer, ou da transição de uma tonalidade para outra, mas nossa percepção era sempre de uma pele translúcida sob a qual cores variadas em formas geométricas se ondulavam e deslocavam sob a superfície.

Esses primeiros trabalhos não permitiam ver nenhuma parte do maquinário, o que logo mudaria. Aos poucos esses “aparelhos” foram dando lugar a objetos tridimensionais que possuíam elementos em movimento, com sentidos e padrões distintos. A veladura da tela foi removida e as lâmpadas substituídas por pequenas hastes pontuadas por esferas, cubos e outros volumes geométricos coloridos que se moviam como peças de um balé estranho.

A luz não era mais um elemento essencial. As maquinetas novas podiam lembrar, ao mesmo tempo, modelos de sistemas solares ou modelos celulares microscópicos, articulando elementos muito mais concretos que a luminosidade. As engrenagens e mecanismos eram articulados, ritmados e sincronizados, totalmente controlados pelo artista, pontuados por uma palheta de cores muito específica – entre as primárias e as secundárias, o preto e o metálico. 

O que Palatnik alcançou era possivelmente inédito até então: conseguir fazer com que máquinas e motores gerassem obras de arte e não utensílios, e que também fossem lidas como arte pelo público, e não como meras engenhocas ou invencionices.

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