David Hammons discute como é ser negro nos EUA

O renomado artista usa o próprio corpo e signos de seu país para falar sobre identidade e representação

David Hammons
David Hammons

“David sempre desenterra narrativas que são difíceis para nós americanos aceitarmos. Estas narrativas são duras e geralmente nos lembram onde falhamos como país. Ele não nos deixa esquecer nossas aspirações, mas aponta que ainda temos um longo caminho para atingi-las”, declarou Darren Walker, presidente da Ford Foundation, num vídeo de apresentação de uma escultura pública projetada por David Hammons para a cidade de Nova York – onde o artista vive e trabalha desde os anos 1970. 

Boa parte dos trabalhos de Hammons reflete seu compromisso com os direitos civis e os movimentos do Black Power. Durante as manifestações anti-racistas #blacklivesmatter que ganharam força depois do assassinato de George Floyd,  as obras desse artista afro-americano ganharam mais voz nos últimos dias.

David Hammons
Body Prints, de David Hammons
David Hammons
Body Prints, de David Hammons

Em sua série mais famosa, Body Prints, Hammons passa graxa preta no próprio corpo e depois pressiona-se sobre o papel. Em seguida, adicionava grafite ou outro meio para acentuar a impressão corporal. Em algumas impressões, ele colocava a bandeira americana e em outras adiciona uma máscara tradicional africana lugar do rosto – deixando ainda mais claro que trata-se de trabalhos sobre identificação afro americana e representação. O resultado são imagens extremamente corpóreas e, ao mesmo tempo, fantasmagóricas – colocando em xeque o que significa presença e memória. 

David Hammons
David Hammons fazendo seus Body Prints

Em Spade with Chains, o artista ironiza o papel do homem negro na sociedade americana fazendo um trocadilho associando a pá de jardinagem a uma máscara africana.  A série é uma clara uma declaração contemporânea sobre as questões de servidão e resistência. Já em How Ya Like Me Now?, de 1988, Hammons pintou uma versão branca de Jesse Jackson ( ativista que participou, ao lado de Martin Luther King Jr., da luta pelos direitos civis para os negros nos EUA e foi 2 vezes pré-candidato às eleições presidenciais)  com direito a cabelos loiros e olhos azuis). Abaixo da imagem, incluiu a pergunta: Como você gosta de mim agora? 

David Hammons
How Ya Like Me Now?, de David Hammons

Em Black First, America Second, o artista coloca duas imagens dele mesmo enroladas na bandeira norte-americana: trata-se do seu eu negro ao lado do seu eu norte-americano – duas identidades que estão divididas e fundamentalmente em desacordo. Estes dois David Hammons  estão constantemente lutando entre si e não podem ser unidos.

David Hammons
Black First, America Second, de David Hammons

Império do efêmero 

Em 1983, ele fez uma performance chamada Bliz-aard Ball Sale sale na qual o artista vendia bolas de neve de diferente tamanhos. Hammons queria ressaltar que arte é algo que está no ar para todos e não pode ser comprada ou possuída. Ele discute, ainda, as noções de espaços públicos e privados, bem como o que constitui uma mercadoria valiosa: o ato serve tanto como uma paródia sobre troca de mercadorias quanto como um comentário sobre a natureza capitalista da arte promovida pelas galerias de arte. 

 David Hammons
David Hammons em Bliz-aard Ball Sale

Ainda este ano ele deverá concluir uma instalação em um dos piers de NY que traz o esqueleto de um dos prédios industriais da região sobre a água – uma homenagem a Gordon Matta Clark. A ideia é criar uma espécie de fantasma da arquitetura da cidade para lembrar aos nova iorquinos da importância dos piers com espaço de encontro e também para questionar temas como a gentrificação dos bairros da cidade que “empurra” as pessoas com menos condições ( incluindo muitos afrodescendentes)  para cada vez mais longe do centro. 

Fã de Charles White, Bruce Nauman, John Baldessari e Chris Burden, Hammons  demonstra frequentemente que compartilha preocupações com minimalismo e arte pós-minimalista, mas com referências duchampianas e sem parar de questionar o lugar dos negros na sociedade americana.  Certa vez Hammons viu uma obra sobre a percepção da luz de James Turrell e declarou: “Eu gostaria de poder fazer arte assim, mas estamos muito oprimidos para eu ficar me divertindo por aí… Eu quero chegar a isso, estou tentando, mas ainda não estou livre o suficiente. Ainda sinto que preciso que passar minha mensagem”. Nesta semana ele precisa ser ouvido mais do que nunca. 

African American Flag, de  David Hammons
African American Flag, de David Hammons
David Hammons
Body print, de David Hammons
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