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“Histórias Indígenas” subverte pré-concepções das artes contemporâneas

Exposição no MASP oferece um amplo panorama sobre as culturas originárias reunindo perspectivas de 4 continentes

Edgar Kanaykõ Xakriabá, Parlamentares indígenas durante momento solene que celebra a luta dos povos indíegnas, 2023

Um retrato de Máxima Acuña, uma agricultora símbolo da luta ambientalista indígena, de punho cerrado; uma fotografia de um conjunto de militantes e políticos indígenas ocupando a tribuna central da Câmara dos Deputados; um vídeo de Ailton Krenak discursando na Assembleia Nacional Constituinte, em 1987, pela urgência da proteção ambiental e do reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, estão entre as primeiras obras que o espectador encontra ao adentrar a exposição “Histórias Indígenas”, em São Paulo. 

Não parece ser mero acaso “Ativismos” ser o primeiro núcleo temático posicionado na entrada do primeiro andar do museu, onde se inicia a mostra. Antes que haja qualquer espaço para associações simplistas com “arte naïf” (ingênua) – termos amplamente associados à produção de artistas indígenas e não-branco em geral –, a exposição se já se revela, em seus primeiros contatos, como um ato de subversão, desafiando estereótipos romantizados e apresentando personalidades politicamente conscientes e engajadas. A própria presença expressiva de artistas indígenas ocupando e protagonizando o evento de um dos museus mais relevantes do Hemisfério Sul, pautando os mais variados temas como lhes convém, por si só, já afirma uma postura política de resistência no mercado de arte e no país.

Melissa General, Nitéwake:non [O lugar de onde eu venho], 2015

Essa é uma daquelas exposições audaciosas. São aproximadamente 170 artistas de 4 continentes, mais de 280 obras e 12 curadores, entre os curadores-adjuntos de arte indígena no MASP – Edson Kayapó, Kássia Borges Karajá e Renata Tupinambá – e outros convidados internacionais – Abraham Cruzvillegas, Alexandra Kahsenni:io Nahwegahbow, Jocelyn Piirainen, Michelle LaVallee, Wahsontiio Cross, Bruce Johnson-McLean, Irene Snarby, Nigel Borell e Sandra Gamarra.

“O maior desafio é sempre trazer a nossa realidade. A sociedade brasileira foi construída dentro de todo um imaginário social a respeito do que são as pessoas indígenas e até mesmo sobre o que é a ‘arte indígena contemporânea’.”, comenta Edson Kayapó sobre o processo de concepção da mostra. “Essa arte não deixa de trazer a tradicionalidade, mas ela mostra que temos uma cultura viva, que se adapta aos tempos – que na nossa concepção, é como se existisse todos os tempos ao mesmo tempo.”

Nesse sentido, encontramos uma rica variedade de linguagens, suportes e perspectivas, dentro do vasto espectro do que se entende por “histórias indígenas”, rompendo também com a homogeneização dos diferentes povos originários pelo mundo. “O Joseca, do povo Yanomami, apresenta uma perspectiva de um cerimonial funerário a partir do ponto de vista do povo dele, obviamente, que não é a mesma forma de relação com o morto do Povo Mebêngôkre”, exemplifica Kayapó. Ele continua, citando também as materialidades da obra “Barão de Antonina” do coletivo Kókir: “Alguém pode perguntar: ‘mas carrinho de supermercado e plástico fazem parte da tradição originária?’ – Não, não fazem parte, mas nós vivemos no tempo presente e as nossas tradições de antepassados e cosmologia, obviamente, dialogam e se atualizam no tempo presente”.

Ele continua, citando também a obra “Barão de Antonina” do coletivo Kókir, que apresenta um carrinho de mercado vazio e trançado numa técnica de cestaria com uma fita plástica, para evidenciar a escassez de matéria prima e denunciar a fome nas terras indígenas, enquanto critica a sociedade do consumo. “Alguém pode perguntar: ‘mas carrinho de supermercado e plástico fazem parte da tradição originária?’ – Não, não fazem parte, mas nós vivemos no tempo presente e as nossas tradições de antepassados e cosmologia, obviamente, dialogam e se atualizam no tempo presente”.

Rosalie Favell, Iris, 2011

Em “Iris”, obra da série “Gostaria que você estivesse aqui”, a artista canadense Rosalie Favell, mergulha em sensibilidade para falar de temas ligados à memória, à saudade e à relação de pertencimento com a terra. A obra combina fotografias capturadas pela avó da artista, com outras imagens contemporâneas desses mesmos lugares, criando um diálogo visual entre dois tempos distantes, segundo o entendimento ocidental. Nestas justaposições, a artista converge passado e presente, evocando a presença por meio da lembrança da terra, ao mesmo tempo que dá forma à ausência. 

Com uma abordagem ousada e irônica, o artista Andy Medina dispõe para o público levar para casa cartazes com uma questão expressa em dois idiomas indígenas, guarani e zapoteca. Ao conferir a etiqueta de ficha técnica da obra, o espectador descobre a tradução dessas frases: “Quem é analfabeto agora?”. 

No núcleo “Histórias de pintura no deserto”, encontramos as mais belas composições abstratas resultantes da arte aborígene na Austrália atualmente. Entre essas, destacam-se algumas telas e superfícies de madeira pintadas a partir da icônica técnica de “pontos”. 

Alguns meses atrás, também dentro da programação temática do ano de “Histórias Indígenas”, o Museu apresentou a exposição “Paul Gauguin: o outro e eu”, explorando o ponto de vista do artista sobre os povos originários da região do Haiti. É interessante notar que, na exposição atual, temos uma inversão de papéis com o núcleo “A construção do ‘eu’”, onde o termo “eu” agora se refere às representações de pessoas indígenas da região do México. Enquanto a mostra do artista francês é baseada em um olhar fetichista e exotificado – de alguém que inclusive adotou uma postura violenta ao se relacionar com crianças de 13 e 14 anos de idade nas Ilhas do Pacífico –, o núcleo da exposição coletiva em cartaz oferece uma rica pluralidade de investigações sobre a própria identidade, entre concepções individuais e coletivas. Aqui, destacam-se obras como “Autorretrato 61”, um conjunto de selfies em polaroid usados como espelho do artista Francisco Toledo. Além desta, uma rara pintura-colagem de Frida Kahlo – que possuía ascendência indígena – que utilizou sua produção artística como uma poderosa ferramenta poética de exploração de sua identidade. Nesta obra, intitulada “Allá Cuelga mi Vestida”, a artista faz de um huipil, vestimenta tradicional, e de um cenário urbano caótico, seu autorretrato.

Frida Kahlo, Allá Cuelga mi Vestida, 1933

“Histórias Indígenas” no MASP integra um cenário inédito no circuito de arte brasileiro, marcado pela crescente abertura de museus, galerias e feiras para novos nomes de artistas indígenas – apesar de alguns dos países representados na mostra já terem trilhado esse caminho de reconhecimento décadas atrás.

“Apostaram em extinção por tanto tempo, mas o que os dados do IBGE mostram é justamente o oposto de extinção: é o crescimento significativo de indígenas no país. As nossas tradições, as nossas línguas e as nossas cosmologias estão sendo revitalizadas. E eu diria que tudo isso está acontecendo à revelia da vontade do Estado e do modo de produção capitalista, porque por estes não haveria nada disso”, argumenta Kayapó. “É necessário atestar que esse movimento de ocupação dos espaços institucionais e culturais é um movimento irreversível, tanto do ponto de vista da ocupação dos artistas, quanto da ocupação desses espaços estratégicos de curadoria”.

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