Marina Abramović em Pernambuco: saiba mais sobre a Usina de Arte

Abramović inaugura sua nova obra monumental na Usina de Arte, um parque artístico e botânico que se estende por 33 hectares, localizado no distrito da Usina Santa Terezinha, em Água Preta, na Zona da Mata Sul de Pernambuco

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Marina Abramovic fotografada em Munique, Alemanha em abril de 2020. Foto: Frank Bauer/Contour by Getty Images.

Uma das artistas performáticas mais renomadas do mundo está prestes a deixar mais uma marca no cenário artístico brasileiro. Marina Abramović inaugura amanhã, dia 03 de janeiro, sua nova obra monumental na Usina de Arte, um parque artístico e botânico que se estende por 33 hectares, localizado no distrito da Usina Santa Terezinha, em Água Preta, na Zona da Mata Sul de Pernambuco.

Generator, Marina Abramović. Crédito: Andréa Rêgo Barros.
Generator, Marina Abramović. Crédito: Andréa Rêgo Barros.

Intitulada “Generator”, a obra se destaca pela imponência de um muro preto em dimensões impressionantes: 25 metros de comprimento, 3 metros de altura e 2,5 metros de largura, que pode ser avistado em uma das extremidades elevadas da Usina. Além disso, a instalação incorpora grandes pedras de quartzo vindas de Minas Gerais, com o intuito de promover a interação pública com os cristais e sua energia. “Neste momento de turbulenta história humana, vivemos uma época de guerras, violência, pobreza e aquecimento do nosso planeta. O rápido desenvolvimento técnico afastou-nos da natureza e perdemos a capacidade de usar a intuição, a telepatia e de lembrar os nossos sonhos. Perdemos nosso centro espiritual. A função do ‘Gerador’ não é apenas a de uma escultura. Destina-se à interação pública com os cristais e a sua energia, na esperança de restaurar a nossa capacidade de nos conectarmos com a natureza através da quietude e da presença no aqui e agora”, afirma Abramović, que acredita que o rápido desenvolvimento tecnológico afastou as pessoas do ecossistema e as privou da capacidade de usar a intuição, a telepatia e de lembrar de seus sonhos.

“Generator” não é apenas uma obra para ser vista, mas sim para ser experienciada. Inspirada em “The lovers – The Great Wall Walk” [Os amantes – A caminhada da grande muralha], uma performance realizada por Abramović com seu então companheiro e artista alemão Ulay na Muralha da China em 1988, a obra convida o visitante a percorrer um caminho até chegar ao muro, evocando uma jornada de peregrinação e introspecção que ecoa a experiência vivida pelo ex-casal.

The Lovers, Marina Abramovic / Ulay, março-junho 1988. Cortesia: The Marina Abramovic Archives / Dacs 2021.

Além disso, Marina Abramović tem uma longa história de pesquisa espiritual no Brasil, como evidenciado em seu documentário Espaço Além – Marina Abramović e o Brasil, lançado em 2016, disponível na Amazon Prime. O filme acompanha a jornada da artista por diferentes manifestações de poder espiritual na cultura brasileira, incluindo os rituais do Vale do Amanhecer, o xamanismo na Chapada Diamantina, o candomblé na Bahia e os cristais de Minas Gerais. Essa experiência enriqueceu ainda mais sua conexão com o país e suas investigações sobre o potencial de cura dos minerais brasileiros.

Usina de Arte

No coração da Zona da Mata Sul de Pernambuco, encontra-se a Usina de Arte, um projeto inovador idealizado por Ricardo e Bruna Pessôa de Queiroz que combina um museu de arte contemporânea ao ar livre com um jardim botânico exuberante. Desde sua criação em 2015, a Usina de Arte se tornou um verdadeiro catalisador de transformação socioeconômica para mais de 6 mil pessoas que residem em seu entorno, na vila de Santa Terezinha. Atividades que promovem educação, cultura, resiliência ambiental e empreendedorismo são os pilares que sustentam essa notável iniciativa.

Usina de Arte. Crédito: Charles Jhonson

A comunidade de Santa Terezinha compartilha seu nome com a antiga Usina Santa Terezinha, cuja história remonta a 1929, quando foi fundada sob a direção da família Pessôa de Queiroz. Em menos de duas décadas, a usina se tornou a maior produtora de álcool e açúcar do Brasil na década de 1950, contando com uma infraestrutura impressionante que incluía um hangar, mais de 100 quilômetros de estradas de ferro, 21 locomotivas e mais de uma centena de vagões para a logística no setor sucroalcooleiro. No entanto, em 1998, a usina enfrentou uma grave crise que levou ao encerramento de suas atividades de moagem.

Passados quase 75 anos de seu ápice na produção de açúcar e álcool, a Usina de Arte está testemunhando um novo capítulo em sua história, um que não está mais relacionado à transformação da cana-de-açúcar em produtos industriais. Hoje, as colheitas da Usina de Arte estão relacionadas a uma nova visão, que valoriza a cultura, a educação e a sustentabilidade no Nordeste brasileiro.

Uma das iniciativas mais visíveis realizadas pelo atual empreendimento é o constante trabalho de reflorestamento. Até o final de 2022, aproximadamente 35 hectares já receberam cerca de 10 mil plantas de mais de 600 espécies diferentes. No entanto, o parque artístico-botânico é apenas uma parte visível do amplo leque de apoio fornecido à vila de Santa Terezinha e aos municípios de Água Preta (PE) e Campestre (AL). Entre essas iniciativas, destacam-se a escola de música, a biblioteca e o centro de conhecimento público, com um valioso acervo literário. Além disso, a Usina de Arte possui o FabLab, equipado com terminais de computadores conectados à internet, impressoras 3D e cortadoras a laser, disponíveis para projetos da comunidade. Também há parcerias com unidades escolares locais para promover novas práticas pedagógicas.

Tinha que acontecer (Cabeça de bandeirante), Flávio Cerqueira, 2016

Com um surpreendente parque de esculturas fora do eixo Rio – São Paulo, seu acervo reúne mais de 40 obras de nomes contemporâneos locais, brasileiros e internacionais e com atual curadoria de Marc Pottier. Os artistas residentes trabalham em colaboração com as equipes da Usina e com os moradores de Santa Terezinha, criando suas obras diretamente no local. Para os idealizadores essa abordagem evita a simples acumulação de obras de arte e, em vez disso, oferece aos visitantes a oportunidade de repensar a história da escravidão, das culturas indígenas, da influência africana, das questões ecológicas e das diferentes plantações do Nordeste do Brasil. O resultado é uma experiência que amplia as fronteiras culturais e desafia a forma como vemos e entendemos o passado e o presente.

Dentre os diversos artistas que têm contribuído para o enriquecimento do parque, destacam-se nomes como Regina Silveira, Artur Lescher, Iole de Freitas, Alfredo Jaar, Paulo Bruscky, Denise Milan, Matheus Rocha Pitta, Juliana Notari, Flávio Cerqueira, Bené Fonteles, Frida Baranek, Julio Villani, Saint Clair Cemin e Liliane Dardot apenas para citar alguns.

Diva, Juliana Notari, 2020

Em 2021, o Parque Artístico Botânico ganhou atenção tanto em âmbito nacional quanto internacional, quando a obra “Diva”, de Juliana Notari, foi instalada. A escultura, que representa uma vulva com 33 metros de comprimento, provocou acalorados debates e gerou repercussões em diversas esferas. Além da simbologia da vulva, a execução da obra também foi alvo de discussões.

Serviço:

Generator [Gerador], site-specific de Marina Abramović
Inauguração: 03 de fevereiro de 2024
Local: Usina de Arte
Entrada gratuita

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