Fique por dentro: 35ª Bienal de São Paulo divulga lista completa de artistas

Exposição revela processos de ruptura e resistência como possibilidades de sobrevivência em mundos que estão colapsando 

Tempo de leitura estimado: 7 minutos
Bouchra Ouizgue
Bouchra Ouizgue

Sob o título Coreografia do Impossível e curadoria de Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel, a 35ª Bienal de São Paulo abrirá, em setembro deste ano, apresentando uma potente seleção de artistas. Agora, com 120 nomes confirmados, a lista reforça o compromisso da edição em ecoar as vozes das diásporas e de povos originários, ampliando o diálogo local e internacional.

Entendendo ideias de justiça, liberdade e igualdade como realizações impossíveis, a ideia de “coreografia” aparece, aqui, como sugestão de desenhos – que são, como numa dança, criados por meio da troca com o outro, em constante diálogo e negociação – ou elaboração de processos de ruptura para sobrevivência em mundos que estão colapsando.

Elizabeth Catlett
Elizabeth Catlett

Para desenhar sequências que criam possibilidades, é preciso começar, portanto, olhar para imaginações de tudo e todos que rompem com a visão colonizadora, branca, heteronormativa e etnocêntrica predominante até então. Diante de um mundo marcado por crises – climáticas, humanitárias, sociais, económicas e sanitárias –, a primeira pergunta lançada pelo grupo curatorial foi: “Como corpos em movimento são capazes de coreografar o possível, dentro do impossível?”. O título da exposição não revela um tema, mas sugere um experimento, um convite às imaginações radicais a respeito do desconhecido para compreender as múltiplas estratégias criadas para imaginar, sobreviver ou escapar. São estratégias que podem ser desenvolvidas em dois sentidos: de um lado são práticas que desafiam, resistem ou recusam esses sistemas globais de violência; do outro, especulam e antecipam o que está por vir. 

The Living and Dead Ensemble
The Living and Dead Ensemble
Ellen Gallagher
Ellen Gallagher

Tempo espiral 

O conceito de antecipação, aqui, é essencial, pois esta Bienal assume um tempo descontínuo, onde corpos podem transitar em diferentes velocidades e dimensões. “A noção de tempo espiralar – concepção comum em sociedades não-brancas ou ocidentais – é primordial para a desmarcação da ideia de passado, presente e futuro como categorias consecutivas ou progressivas ou lineares”, explica Menezes. “Essa discussão é fundamental para compreendermos que não estamos vivendo num mundo em colapso, mas que vários mundos vêm colapsando em diferentes lugares e momentos do que chamamos de história”. Por isso, a curadoria nos traz essa ideia do tempo que volta em si mesmo, que espirala, que bailarina. E questiona: Quais são as estratégias que já vêm sendo realizadas para enfrentar mundos que já vêm terminando há muito tempo; mundos que já se extinguiram e estão em ruínas; mundos que seguem sendo destruídos? 

Manuel Chavajay
Manuel Chavajay

Fora do eixo

Torna-se cada vez mais necessário, para sobreviver, encontrar ritmos, ferramentas, estratégias, tecnologias e procedimentos (simbólicos, econômicos e jurídicos) para elaborar movimentos de ruptura, que nascem de elementos e ações de resiliência e enfrentamento. Saber parar, recuar, avançar, acelerar ou, às vezes, andar trás, como Curupira ou como a dupla Pauline Boudry e Renate Lorenz, que criou, para o pavilhão suíço da 58th Bienal de Veneza, em 2019, a video-instalação Moving Backwards. 

Pauline Boudry e Renate Lorenz
Pauline Boudry e Renate Lorenz

Partindo da sensação de ser empurrado para trás, um reflexo das políticas reacionárias que cresceram no mundo inteiro, a dupla criou um ambiente imersivo que lembra uma casa noturna. E propôs, aos performers, que fizessem movimentos para trás ou retrógrados, combinando gestos pós-modernos e dança urbana com técnicas de guerrilha e elementos da cultura underground queer, como dispositivo de resistência. 

Sammy Baloji
Sammy Baloji

Negociando representação 

A ruptura do pensamento moderno liberal é outro ponto crucial para esta dança acontecer. Afinal, o próprio conceito de liberdade está intrinsecamente ligado a este modo de pensar e, nele, encontramos um conflito entre os conceitos liberdade e ameaça. Por isso, a curadoria sugere uma reflexão sobre como movimentos são regulados e como eles regulam também o nosso imaginário social. A artista Torkwase Dyson olha para os deslocamentos passados, os processos migratórios forçados, como uma geografia do movimento que se expressa no que ela chama de “pensamento composicional negro”: ela cria exercícios de abstração que pode trazer as características necessárias para produzir esse sistema de fuga e de escape.

Este é apenas um dos exemplos das obras da mostra que buscam fugir de uma norma tema-figura como questionamento, também, dos sistemas de representação e categorização do mundo. “São obras que estão tentando escapar desse sistema também de captura que sempre aproximam, por exemplo, negro à violência, que aproxima determinados modos de compor a determinado tipo de pessoa. Tratam-se de estratégias políticas, mas sobretudo estéticas”, explica Lima. O trabalho é também sobre uma negociação de nossas representações – tema presente em outras obras da mostra com as quais artistas como Leilah Weinraub e Tadáskía, por exemplo, contestam o mundo binário ou heteronormativo. “A História da Arte, como conhecemos, já não consegue abarcar nem como ‘diferente’ e nem como ‘outro'”, explica Menezes. 

Nontsikelelo Mutiti
Nontsikelelo Mutiti
Wifredo Lam
Wifredo Lam

Dançar, coreografar e descobrir regras juntos

Na língua inglesa, existe uma diferença entre as palavras play e game. Game é um jogo realizado respeitando regras pré-estabelecidas, mas em play as crianças vão se descobrindo e definindo as regras continuamente”, explica Borja-Villel sobre o processo de elaboração coletiva da exposição sem tema, seção, núcleo ou qualquer tipo de sistematização, classificação ou catalogação. O coletivo lembra que o norte tem uma obsessão em categorizar, marcar, elaborar conceitos e justificativa para tudo. Mas que é  importante romper com isso também, criando um espaço queer, que não está definido, que está sempre em movimento.  

Stitched Panorama
Stitched Panorama

Com a ideia de que só aprendemos juntos, de que só é possível dançar com outros. E de que, mesmo sozinhos, nossa existência só acontece em referência por um espaço e tempo, a curadoria irá propor também uma expografia e circulação fluida, sem demarcação de fronteiras, direções ou ritmos.

Luiz de Abreu
Luiz de Abreu

Cada um irá, portanto, experienciar a Bienal de São Paulo de seu jeito – o que possibilitará diferentes leituras e articulações. Um processo numa outra palavra coreográfico, que fala de sintonia entre as obras e artistas e as questões que as suas obras podem levantar para você de um modo absolutamente distinto, que é o que abordam, tocam, sensibilizam a minha presença no mundo. “É um desafio se deslocar das categorias de pensamento. Por isso, a ideia de que a construção de epistemologia que se desloca dessa temporalidade ocidental e que, portanto, é universal e que, portanto, se coloca como categórica e única, acaba por criar uma ideia de subestimação do público, como se o público só fosse capaz de entender ou destruir por meio do pensamento categórico –  modo como, por exemplo, a enciclopédia se organiza e que, portanto, os próprios museus se organizam” completam. As obras se colocam em relações, em conflitos e tensões, criando esses consensos e dissensos.

Seleção de artistas | Lista completa:

Confira, abaixo, os nomes que vão compôr a edição:

  1. Ahlam Shibli
  2. Aida Harika Yanomami, Edmar Tokorino Yanomami e Roseane Yariana Yanomami
  3. Aline Motta*
  4. Amador e Jr. Segurança Patrimonial Ltda.
  5. Amos Gitai
  6. Ana Pi e Taata Kwa Nkisi Mutá Imê*
  7. Anna Boghiguian*
  8. Anne-Marie Schneider
  9. Archivo de la Memoria Trans (AMT)
  10. Arthur Bispo do Rosário
  11. Aurora Cursino
  12. Ayrson Heráclito e Tiganá Santana*
  13. Benvenuto Chavajay
  14. Bouchra Ouizguen*
  15. Cabello/Carceller
  16. Carlos Bunga
  17. Carmézia Emiliano
  18. Castiel Vitorino Brasileiro*
  19. Ceija Stojka
  20. Charles White
  21. Citra Sasmita
  22. Colectivo Ayllu
  23. Cozinha Ocupação 9 de Julho
  24. Daniel Lie*
  25. Daniel Lind-Ramos
  26. Davi Pontes e Wallace Ferreira
  27. Dayanita Singh*
  28. Deborah Anzinger*
  29. Denilson Baniwa*
  30. Denise Ferreira da Silva
  31. Diego Araúja e Laís Machado
  32. Duane Linklater*
  33. Edgar Calel
  34. Elda Cerrato*
  35. Elena Asins
  36. Elizabeth Catlett*
  37. Ellen Gallagher* e Edgar Cleijne
  38. Emanoel Araújo
  39. Eustáquio Neves
  40. flo6x8
  41. Francisco Toledo
  42. Frente 3 de Fevereiro*
  43. Gabriel Gentil Tukano*
  44. George Herriman
  45. Geraldine Javier*
  46. Grupo de Investigación en Arte y Política (GIAP)
  47. Gloria Anzaldúa
  48. Guadalupe Maravilla
  49. Ibrahim Mahama
  50. Igshaan Adams*
  51. Ilze Wolff
  52. Inaicyra Falcão*
  53. Januário Jano
  54. Jesús Ruiz Durand
  55. John Woodrow Wilson
  56. Jorge Ribalta
  57. José Guadalupe Posada
  58. Juan van der Hamen y León
  59. Judith Scott
  60. Julien Creuzet*
  61. Kamal Aljafari
  62. Kapwani Kiwanga
  63. Katherine Dunham
  64. Kidlat Tahimik
  65. Leilah Weinraub*
  66. Leopoldo Méndez
  67. Luana Vitra
  68. Luiz de Abreu*
  69. MAHKU
  70. Malinche
  71. Manuel Chavajay*
  72. Margaret Taylor Goss Burroughs
  73. Marilyn Boror Bor*
  74. Marlon Riggs
  75. Maya Deren
  76. M’barek Bouhchichi
  77. Melchor María Mercado
  78. Morzaniel Ɨramari
  79. Mounira Al-Solh*
  80. Nadal Walcott*
  81. Nadir Bouhmouch e Soumeya Ait Ahmed*
  82. Nikau Hindin
  83. Niño de Elche*
  84. Nontsikelelo Mutiti*
  85. Patricia Gómez e María Jesús González
  86. Pauline Boudry e Renate Lorenz*
  87. Philip Rizk*
  88. Quilombo Cafundó
  89. Raquel Lima
  90. Ricardo Aleixo
  91. Rolando Castellón*
  92. Rommulo Vieira Conceição
  93. Rosa Gauditano
  94. Rosana Paulino*
  95. Rubem Valentim
  96. Rubiane Maia
  97. Sammy Baloji*
  98. Santu Mofokeng*
  99. Sarah Maldoror*
  100. Sauna Lésbica por Malu Avelar com Ana Paula Mathias, Anna Turra, Bárbara Esmenia e Marta Supernova
  101. Senga Nengudi
  102. Sidney Amaral
  103. Simone Leigh
  104. Sônia Gomes
  105. stanley brouwn*
  106. Stella do Patrocínio
  107. Tadáskía*
  108. Taller 4 Rojo
  109. Taller NN
  110. Tejal Shah*
  111. The Living and the Dead Ensemble*
  112. Torkwase Dyson*
  113. Trinh T. Minh-Ha*
  114. Ubirajara Ferreira Braga
  115. Ventura Profana
  116. Wifredo Lam*
  117. Will Rawls
  118. Xica Manicongo
  119. Yto Barrada
  120. Zumví Arquivo Afro Fotográfico

Os nomes seguidos por * já foram anunciados na primeira lista parcial.

Ana Pi
Ana Pi

Serviço:

35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível

Curadoria: Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel

Data: De 6 de setembro até 10 dezembro de 2023

Funcionamento: ter, qua, sex, dom: 10h – 19h (última entrada: 18h30); qui e sáb: 10h – 21h (última entrada: 20h30)

Local: Parque Ibirapuera · Portão 3 – Pavilhão Ciccillo Matarazzo

Entrada gratuita

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