Artista Aposta: Isabela Etchenique

Conheça a artista de apenas 25 anos que transforma cartografias fluviais de São Paulo em pesquisas pictóricas e poéticas

Tempo de leitura estimado: 3 minutos
Retrato de Isabela Etchenique. Cortesia da artista.

Tendo crescido com os olhos cimentados pelos longos anos na cidade grande, a artista paulistana buscou enxergar para além do que é aparente nas ruas para sua pesquisa poética. A partir do contato com a iniciativa “Rios e Ruas”, coletivo que mapea cursos d’água escondidos e organizam visitas por estes lugares, Isabela Etchenique passou a se interessar pelos rios visíveis e “invisíveis” da sua cidade.

Somente em São Paulo, estima-se que tenha entre 300 e 500 rios concretados embaixo de casas, edifícios e ruas. Por isso, a maioria de seus habitantes tem uma percepção de uma cidade com três ou quatro rios apenas, quando na verdade, estamos quase sempre a mais de 300 metros de um curso d’água. Sendo assim, a artista nos convida a mergulhar em sua produção pictórica e a olhar através do asfalto para enxergar possibilidades poéticas. 

No momento de escolher sua graduação, Isabela se interessou primeiramente por arquitetura e design, mas ingressou na faculdade de artes buscando uma liberdade criativa. Contudo, ainda é possível enxergar os vestígios dos cursos anteriores em suas composições, especialmente nos seus primeiros trabalhos. Esses, se desdobravam sobretudo em colagens e gravuras, partindo da ideia de desconstrução e reconstrução imagética da cidade. 

Mas podemos considerar que a obra Voragem foi o verdadeiro divisor de águas de sua produção. O trabalho construído em camadas retrata os cursos e córregos de água da cidade, sendo que na camada inferior é estampado desenhos de linhas livres, retratando como esses canais poderiam ser no passado, e na camada superior, os fios de latão referenciam como eles são hoje.

A pintura expandida de 168 peças é um exemplo de como a artista experimental dá autonomia para os materiais para revelar o caráter indomável de seu assunto. Enquanto os vidros sobrepostos possuem um recorte mais homogêneo e preciso, os debaixo são mais irregulares por não terem obedecido às réguas de corte da artista.  

A escolha do material também é bastante significativa tendo em vista que o vidro possui a areia como matéria-prima. A areia é um elemento que constantemente está em contato com os mares, mas que para ser transformada em vidro, precisa passar por um processo de superaquecimento e eliminação da água. Nesse sentido, a elaboração do material está em paralelo com o processo de intervenção humana nas canalizações. 

É interessante notar como as sombras e transparências também compõem o trabalho, sugerindo uma sensação de fluidez e penetração através do material impermeável. 

Isabela Etchenique em seu ateliê produzindo a série Margem

Quando a artista faz a série Margem talvez seja o mais próximo de trazer suas pautas para o campo político. Ela faz cada obra em formato de bandeira e as pendura, como se estivesse sinalizando a emergência do tema em questão. No entanto, ao dispor cada figura cartográfica lado a lado sem juízo de valor, fica claro que seu interesse é mais pictórico e poético do que político.

O intuito de Etchenique, em ambas as séries, é de nos fazer um lembrete poético de que por baixo do concreto onde pisamos diariamente entre os atrasos das nossas rotinas, fluem e movem centenas de rios. 

Ao final do mês que vem, agosto, a jovem artista participará de uma exposição coletiva apenas de artistas mulheres na Nós Galeria que a representa.

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